“A Psicóloga que Veio da Saúde”

Uma parte da nossa existência está nas almas de
quem se aproxima de nós; por isso, não é humana
a experiência de quem viveu dias nos quais o homem
foi apenas uma coisa ante os olhos de outro
homem (PRIMO LEVI, 1988, p.173).

Foi sob essa denominação que fui recebida há um ano atrás na rede de atendimento da assistência social. Assim denominada, qualquer intervenção que eu propunha era designada desta forma e desprestigiada dentro de um serviço que se propunha a outros objetivos. A demanda institucional dirigida a mim parte de uma negativa: “não se trata de proporcionar um tratamento”, mas “garantir o atendimento às necessidades básicas do indivíduo” (Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, BRASIL, 1993). Ou seja: garantia de direitos.

Hoje, olhando o percurso realizado, vejo que eu, enquanto psicanalista, contratada como técnica da assistência social, me instalei na fronteira entre cumprir o que meu papel se propunha o que meu desejo impunha. Desde então, iniciou-se um percurso permeado por muitas questões. A primeira refere-se ao modo como fui nomeada: tratar o que? De que tratamento se trata? O que tenho verificado é que as famílias que chegam para atendimento sofrem e gozam da mesma forma que as da área da saúde. A diferença talvez seja no modo como chegam, o lugar que a instituição ocupa para elas e o lugar no qual a instituição as coloca. E o grande nó se localiza aí.

O próprio Freud (1918/2006) coloca-se a pensar em como poderia se dar a oferta de tratamento psicanalítico em populações em condições de pobreza extrema. Ele, no entanto, alerta para a questão de que a vida dura que os espera após a recuperação da doença as impulsione a permanecer com suas neuroses, que lhes dá direitos à ajuda social. Ele fala então da necessidade de “unir ao socorro psíquico um auxílio material”. Mas, por outro lado, reforça que “a estrutura e a composição desta psicoterapia para o povo” necessitaria continuar fundamentada no rigor da psicanálise.

Porém, em uma instituição que visa garantir lugar para um “Sujeito de Direitos”, onde ficam os “Direitos do Sujeito”? Por mais que as políticas de assistência social tenham evoluído de um assistencialismo puro para a promoção da autonomia do sujeito, o que fui verificando ao longo desse tempo, é que eles continuam sendo colocados na posição de objeto. E isso ocasiona diversos desdobramentos.

1) A não delimitação de uma queixa

Chegam famílias com encaminhamentos que algumas vezes não nomeiam o problema real, em outras vezes não sabem por que vieram e em outras ainda não querem atendimento, vindo por uma imposição de um terceiro (Delegacia, Conselho Tutelar, Ministério Público). Quando se trata de crianças e adolescentes vítimas de violência (física, psicológica, sexual), por conta da investigação que é instaurada a partir da denúncia, eles já tiveram que falar do acontecido inúmeras vezes: ao Conselho Tutelar, à Delegacia, ao técnico do hospital. Já foram submetidos a exames físicos, interrogatórios e intervenções que interferem na dinâmica familiar (afastamento do agressor). São procedimentos padrão. Meu papel tem sido muitas vezes o de ouvir os efeitos que as intervenções dos diferentes serviços provocam. Em alguns casos eles foram buscar ajuda, porém não tinham noção do que viria depois e ouço-os muitas vezes dizer que preferiam que as coisas permanecessem do jeito que estavam. Em outros casos, quem faz a denúncia é alguém de fora, obrigando o sujeito a abrir mão de algo que nem disse que não queria. Essa é uma questão importante de saída, pois Freud colocava que o motor para suportar um tratamento psicanalítico é o sujeito estar sofrendo e querer livrar-se deste sofrimento. Se sequer isso está delimitado, como suportar o que vem de uma escuta do inconsciente?

Como uma adolescente que vem dizer o quanto está brava com os serviços por terem tirado seu padrasto de casa, que mesmo praticando diversas formas de violência contra ela e seus irmãos, era um bom pai, e após ter discorrido diversas vezes acerca da falta que ele faz, admite que preferia que as coisas não tivessem mudado. Este é um caso em que não foi ela a denunciante, e havia um engajamento dela sentir-se desejada enquanto mulher por este homem, vindo um saber de fora lhe dizer que isso não pode. Meu trabalho estava sendo de possibilitar-lhe admitir seu desejo e elaborar isso. Porém,após inúmeros percalços com este caso, a mãe, em seu limite, começa ela também a praticar atos de violência contra os filhos, correndo o risco de perder a guarda deles (em casos de violência, como último recurso a criança é retirada da família e abrigada), e diante disso, eles se unem a ela e contra os serviços que se propõem a protegê-los, inviabilizando o trabalho, pois deixamos de ser oferta de escuta, para sermos investigadores e fiscalizadores.

Não se trata de dizer que a violência não deva ser interrompida ou que não acarrete sofrimento, porém o que ocorre é que se visa um “bem estar do sujeito”, sem perguntar-lhe se para ele isso é um bem, ou se ao menos ele o quer. Conforme Freud (1920/2006) já nos alertara, o sujeito não busca o seu bem (se isso implica em sair da situação que o faz sofrer) ele repete. O que essa política apregoa é que a violência tira  do sujeito a autonomia para considerar-se sendo violado em seus direitos, e, uma vez reconhecendo isso, para conseguir modificar essa situação. Porém desconsidera o fato de que, os serviços vindos de fora e retirando-o, sem lhe perguntar o que ele fazia ali (ou seja, qual sua implicação nisso que o faz sofrer – Freud, 1905 [1901]/2006), o sujeito volta à mesma situação. Retornando ao lugar do qual saiu, seja ele físico, seja armando novamente uma cena para que figure na mesma posição, ou ainda, queixando-se da nova situação. E isso ainda corrobora uma atitude, neurótica por excelência, de que o outro é mesmo o culpado pelo seu sofrimento. Escuto mães dizendo que darão novamente seus filhos para o juiz cuidar, seja porque não o quer, porque não dá conta dele ou porque o Estado não lhe dá dinheiro suficiente para prover suas necessidades.

2) A impossibilidade da associação livre

Freud (1912/2006;1913/2006) enuncia esta enquanto a regra fundamental da análise. Implica em o paciente comunicar tudo o que lhe ocorre, sem deixar de revelar algo que lhe pareça insignificante, vergonhoso ou doloroso, enquanto que ao analista cabe escutar o paciente sem o privilégio, a priori, de qualquer elemento de seu discurso (atenção flutuante).

Na instituição onde trabalho o critério de atendimento é o sofrimento decorrente da situação de violência. Assim, posso acolher atuações, sintomas, inibições, porém a escuta necessita ser direcionada, ou seja, o sujeito só pode sofrer por este motivo. O que tenho tentado enquanto prática é colocar esta delimitação no início do trabalho e a partir daí acolho o que vem, sem direcionar a fala. Minha escuta, porém, sempre tem que estar atenta a que o que o sujeito traga seja relacionado ao evento traumático de violência.

Uma outra questão é quando este evento não se tornou traumático. Crianças pequenas não consideram o abuso sexual enquanto uma experiência traumática, uma vez que estão com suas pulsões polimorfamente organizadas, sem o crivo da censura (Freud, 1905a/2006;1924/2006). Minha intervenção, enquanto garantidora de direitos é o de dar sentido ao evento e instrumentalizar a criança a reconhecer e defender-se de situações futuras (foco do trabalho é a proteção e prevenção da violência). Não há assim possibilidade de elaboração se um sofrimento não se instalou ainda. O que tenho feito é alertar aos pais que com a chegada da adolescência um trauma possa se instalar, a partir da ressignificação da experiência (Freud, 1893-95/2006). Ou mesmo com adolescentes ou mulheres vítimas de violência, que encaram a situação como algo  aceitável eu necessito informá-las do significado da violência pelo qual passaram e seus direitos e meios de defesa.
Assim, nessas ocasiões, é de um outro lugar que falo, assumindo o discurso universitário.

A Psicóloga que Veio da Saúde

No discurso universitário o agente do discurso é o saber (S2), ou seja, há um conhecimento erudito (do Outro) ao qual aquele que o recebe deve se assujeitar. O agente (no caso eu) fala em nome de um saber que não é seu, ou seja, não fala em nome próprio. Assim, a verdade do sujeito é rejeitada e ele é colocado no lugar de objeto ( a ) (QUINET, 1999;PETRI, 2003; ZILIOTTO, 2004).

3) A impossibilidade da imparcialidade e do sigilo

Além disso, quando a proposta é a de ouvir o sujeito, este saber é apropriado e utilizado pelo Estado. É-nos atribuída a função de realizar a oitiva da suposta vítima e enviar relatórios aos órgãos competentes investigadores. A principal subversão que encontrei nesse trabalho foi essa, a de que a técnica da escuta seria usada não para o próprio sujeito, mas para um outro. A fala do sujeito é tomada enquanto valor de prova para a tomada de decisões contra ou a favor dele, de qualquer forma não é para usufruto dele. Que fazer com a neutralidade tão necessária, a relevância dada à realidade psíquica (Freud, 1950 [1892-1899]), se é preciso averiguar a veracidade do relato do sujeito? Não a partir da ótica de seu desejo, mas de verificação de realidade dos fatos? A resposta que consegui dar a isso foi a de, em primeiro lugar falar sobre isso com aquele que chega, e não fazer relatórios conclusivos, apenas reproduzindo a fala do sujeito, sem atribuir-lhe uma interpretação e partindo do princípio de que, se ele falou é porque é verdade. Além disso, abro espaço para que ele possa dizer quais os efeitos da experiência pela qual tem passado, seja decorrente da violência pela qual chegou ali, seja da atuação dos serviços. Geralmente os serviços finalizam seu trabalho após a intervenção e modificação da cena da violência. O meu trabalho começa aí.

4) A manutenção do sintoma

As famílias assistidas pela assistência social posicionam-se enquanto demandantes plenas. São famílias que não têm construída a dimensão da intimidade, não fazem a distinção entre o público e o privado, e suas questões são divulgadas e espalhadas entre os vizinhos, e também entre os serviços. Não possuem timidez, nojo ou receio de falar de suas desgraças, estórias ou particularidades, nem de recontá-las a quem quer que pare para ouvi-los. O serviço, ao fornecer-lhe os benefícios, referenda o quanto são merecedores de compaixão e portanto merecem o título de sofredores, desgraçados, despossuídos e necessitam que o Outro lhe dê: bens materiais, mas principalmente reconhecimento e amor.

O trabalho que tenho sustentado ao longo desse ano é o de que passem a dar a devido valor àquilo que falam, ou seja, de se escutarem, a partir da instalação de um setting; e fazer um corte, não supervalorizando a estória que insistem em desdobrar a cada vez, mas de questionar que parte tem nisso de que se queixam.

5) A não instalação do sujeito suposto saber

Não sei se é possível nomear assim o posicionamento de alguns sujeitos se recusarem veementemente a qualquer intervenção. Não falam, não vêm, não escutam, não querem. Lacan (NÁSIO, 1992) diz que o sujeito suposto saber se instala quando o analista passa a fazer parte do sintoma do analisando, passando a ser o destinatário daquele. Freud (1924/2006) denomina enquanto transferência e define que esta é uma manifestação inconsciente em que protótipos infantis são revividos como se pertencessem à atualidade. O analista é a tela sobre a qual o paciente projeta suas vivências infantis. A partir de Freud, se está apto a ser ouvido pelo outro quando se é colocado em um lugar de determinada importância, passando a partir daí a ter influência sobre o sujeito.

Os casos que chegam a mim são sujeitos cujo Outro já falhou inúmeras vezes e não lhe garantiu resposta satisfatória nos momentos em que mais precisou (experiências reiteradas de frustração e privação). E nós, que nos propomos a garantir direitos, nos vemos inviabilizados de fazê-lo, pois os serviços não funcionam como deveriam, ou até visam garantir algo impossível: como proteger o sujeito dele mesmo?

Essa é a tal da política da “garantia dos direitos”. O que se percebe é que o Estado assume um lugar de ideal, um Outro sem furos que na verdade não existe. Coloca-se como provedor das necessidades do sujeito, como se fosse capaz de suprir o  que ele não consegue prover por conta própria. É como se colocasse essa perspectiva no horizonte, em troca da arbitrariedade de se impor sobre a vida dele e fazê-lo tomar decisões a partir do que impõe sobre sua vida privada. Assim, o Estado dispõe sobre a configuração familiar, quem deve sair de casa, a que distância um senhor deve ficar de sua ex-esposa, de quanto em quanto tempo um pai pode visitar seu filho, que uma mãe é prejudicial a sua filha e esta deve portanto morar com os avós, ou o próprio Estado assume a tutela dos infantes. Mais uma vez impera o discurso universitário.

O problema é que o sujeito não é assim tão obediente e o que se observa é que as famílias seguem essas determinações por um tempo (ou nenhum tempo), e depois voltam a fazer da forma como lhe convêm. Assim, as mulheres que chegam queixando-se da violência do marido, são orientadas a registrar um Boletim de Ocorrência, para que seja instaurado um processo e uma Medida Protetiva de afastamento do agressor. Porém isso não garante que ele se afaste e as notícias de jornal vêm nos dizer que mais um cidadão mata a ex-mulher, mesmo com todos os registros realizados e as medidas protetivas tomadas. Ou mulheres que são ajudadas a sair da vista do parceiro, não conseguem se sustentar, um lugar para morar, ou cuidar dos filhos sozinhas, ou desvincilhar-se do amor por eles e voltam a morar com o agressor. Diante disso me pergunto: existe meios de garantir uma proteção ao sujeito? Garantir uma proteção contra uma escolha que ele mesmo fez? Existe uma Medida Protetiva para o inconsciente?

6) A homogeneização dos sujeitos

Afora essa questão, outra que se verifica é a homogeneização dos sujeitos, no enquadre do trabalho com a família e em grupos, o que achata o sujeito na dimensão da queixa na qual é enquadrado, que muitas vezes nem é ele que delimita, como se o título de “violentados” ou “violentadores” os igualasse a todos numa mesma posição.

Junto com Scarparo (2008) considero importante destacar que considerar a família como um todo é reforçar este lugar de alienação no discurso do Outro, perdendo-se a possibilidade de escuta do sujeito na singularidade do seu sintoma. Pois um filho não está colocado no mesmo lugar que outro na fantasmática parental e um filho faz sintoma para seus pais (Lacan 1969). Assim, é importante delimitar quem pede escuta de seu sofrimento. Cada sujeito é singular e se engaja, dentro dessa mesma categoria, de maneira única, e de formas completamente diversas. Tenho realizado então, atendimentos individuais.

7) A escuta individualizada: uma possibilidade de trabalho?

Scarparo (2008) coloca que é nessa “zona de fronteira” que podemos situar uma escuta do sujeito, orientada pela ética da psicanálise, e que tem no social o seu lugar de enunciação. A partir da idéia subversiva da psicanálise, de que é a oferta que produz a demanda, após garantir algumas condições mínimas de sobrevivência, convido o sujeito a descolar-se do desejo do Outro social, para assumir-se responsável por suas escolhas e as consequências delas em sua vida.

O sujeito, sendo tomado em sua dimensão singular, assumo o discurso do analista, no qual o saber inconsciente surge no lugar da verdade. Não se impõe um ideal, o analista se coloca no lugar do objeto causa de desejo, colocando o outro num lugar de sujeito dividido. Esse funcionamento vai ter como produção os significantes-mestre que assujeitaram o sujeito (PETRI, 2003).

A Psicóloga que Veio da Saúde

Não se trata de uma análise, mas coloca-se a escuta em uma outra dimensão, para além do que é dito. Se o que a psicanálise proporciona é um espaço para o sujeito, abrir a dimensão da escuta proporcionou alguns efeitos.

Como uma garota que pôde elaborar sua condição de enamoramento com o pai e articular seu desejo de separação com o que era permitido por ele. Ou uma mulher, que pôde falar que nunca quis sair do orfanato e ser adotada e como se fez sua vida inteira ser rejeitada a partir de sua escolha de não querer estar ali. Esta paciente mesmo me ensinou muito acerca de meu lugar ali, onde, após sua queixa inicial de violência doméstica, tentamos conseguir um lugar para abrigá-la e verificamos os empecilhos que ela mesma colocava para uma solução prática; e dia a dia eu via o mal estar que ela causava na equipe, por fazer uma demanda impossível de ser cumprida (pois a escuta do sofrimento real da violência nos coloca o imperativo de tirar o sujeito da situação ele implica em risco de vida, real). E o que ela me mostrou, após verificarmos que não tínhamos uma alternativa de saída da situação para ela, quando eu lhe perguntei o que ela vinha buscar comigo, ela nomeou que precisava de “um lugar para se estruturar”. Eu disse que isso poderia oferecer, e ela pôde falar de sua estória e posição na vida, e a partir disso, em seguida ela mesma saiu da situação opressora e foi cuidar da vida, sem precisar que a déssemos a ela.

Um outro caso foi o de uma adolescente que pôde sair de uma posição depressiva importante, falando, através de um personagem de desenho, que começa querendo destruir o mundo para, a partir do encontro com o amor, desejar construir uma família. Ou uma menininha adotada, que foi rejeitada diversas vezes e já se utilizava
disso para despertar pena nas pessoas e conseguir privilégios, seduzindo, ou fazendo-se ser expulsa, ao testar o limite do amor dos adultos. Ela pôde, através da elaboração de sua estória e da posição que assumiu diante dela, reconhecer o lugar que lhe era dado na nova família e conseguir submeter-se a ser a filha esperada por eles e encontrar um lugar para si, menos sofrido. A mãe adotiva, por sua vez, também em escuta individual, pôde elaborar o luto de uma filha idealizada, podendo aceitar a filha real.

Em um outro caso, pude escutar como o sujeito se posiciona diante do horror do encontro com o real da morte, em idade tão precoce, ou experienciar o seu Outro enquanto transgressor de todas as leis, e reconhecer-se no efeito provocado em suas escolhas de vida e na relação atual com a maternidade. Esta mulher, que já esteve sob o risco de perder a guarda do filho por maus tratos e negligência, consegue hoje reconhecer-se nele e falar do prazer em ser mãe.

É possível verificar que, mesmo sob uma mesma denominação, cada caso é singular, e a necessidade de uma especificidade e enquadramento, bem como a direção de um trabalho. Em todos eles foi possível aos sujeitos apropriarem-se do espaço de escuta ofertado e cada um utilizá-lo para o que precisava naquele momento. Alguns deles inclusive se deram alta do serviço, o que atesta a conclusão de um trabalho realizado. Foram intervenções pontuais, com efeitos que talvez possamos situar no nível do terapêutico. Mas que foram viabilizados porque se deixou de lado o “deveria ser” para substituí-lo por “do que você precisa? Ou, “o que veio buscar aqui?” E eu, enquanto psicanalista, pude deixar de lado a demanda institucional e me abrir à demanda do sujeito.

Figueiredo (apud SCARPARO, 2008) coloca o psicanalista neste ponto de fazer funcionar a fala do sujeito, na escuta da singularidade deste, para além do rótulo de “excluídos”, que iguala diferentes, por uma identificação ao discurso social. “Então é preciso indagar pelo desejo diante de olhares paralisados frente ao objeto da necessidade” (p. 15).

Acho que, na medida do possível, em alguns casos, é isso que tenho feito. Dentro de uma política de garantia de direitos, inúmeros embates se configuraram em minha prática, mas especialmente em minha ética. Dia a dia me vejo com o desafio de sustentar um lugar para o sujeito dentro de um espaço que é organizado para um achatamento subjetivo. O preço que pago por isso é suportar esse estranhamento, de alguém meio desconfigurado, inadequado, que não se enquadra e sugere certo mal – estar. Um sujeito meio anti-social, que não ri das mesmas piadas, nem segue a mesma dinâmica do grupo de trabalhadores. Um ser em sua completa condição de extimidade.

Autora: Mônica Fujimura Leite

 

Referência Bibliográfica

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Freud, S. Fragmento da análise de um caso de histeria (1905 [1901]). In: FREUD, Sigmund. Obras Completas. Rio de Janeiro: Imago, 2006. v.7.

Freud, S. A sexualidade infantil. Três ensaios sobre a teoria da sexualidade (1905a). In: FREUD, Sigmund. Obras Completas. Rio de Janeiro: Imago, 2006. v.7.

Freud, S. Recomendações aos médicos que exercem a psicanálise (1912). In: FREUD, Sigmund. Obras Completas. Rio de Janeiro: Imago, 2006. v.12.

Freud S. A dinâmica da transferência (1912a). In: Freud, S. Obras Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 2006. v.12.

Freud, S. Sobre o início do tratamento (1913). In: FREUD, Sigmund. Obras Completas. Rio de Janeiro: Imago, 2006. v.12.

Freud, S. Linhas de progresso na terapia psicanalítica (1919 [1918]). In: FREUD, Sigmund. Obras Completas. Rio de Janeiro: Imago, 2006. v.17.

Freud, S. Além do princípio do prazer (1920). In: FREUD, Sigmund. Obras Completas. Rio de Janeiro: Imago, 2006. v. 18.

Freud, S. A dissolução do complexo de Édipo (1924). In: FREUD, Sigmund. Obras Completas. Rio de Janeiro: Imago, 2006. v.19.

LACAN, J. Nota sore a criança (1969). In: LACAN, J. Outros escritos. Rio de janeiro: Zahar, 2003. p. 369-370.

PETRI, R. Psicanálise e educação no tratamento da psicose infantil: quatro experiências institucionais. São Paulo: FAPESP, 2003. p. 71-75

QUINET, A. (1999) A ciência psiquiátrica nos discursos da contemporaneidade. (Estados Gerais da Psicanálise). Disponível em:www.estadosgerais.org.

SCARPARO, M.L. D. Em busca do sujeito perdido: a psicanálise na assistência social, limites e possibilidades. Dissertação. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2008.

ZILIOTTO, D. M. A posição do sujeito na fala e deus efeitos: uma reflexão sobre os quatro discursos. Psicologia USP, 2004, 15(1/2), 215-223. disponível em: http://www.scielo.br/pdf/pusp/v15n1-2/a21v1512.pdf.

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